Artigo escrito por Marília Saveri | Sócia da Praxis Business

Você pode estar errado.

Já pensou nisso?

Aquilo em que você acredita profundamente pode não ser mais verdade. Repensar é crescer. É um avanço enorme abandonar pontos de vista antigos e lidar com uma nova visão.

Estamos dispostos a reexaminar nossos preconceitos, questionar nossas verdades e ouvir atentamente perspectivas diferentes?

Em um mundo de rápidas mudanças, precisamos investir tempo aprendendo, mas também repensando e desaprendendo. Em um cenário de pós-pandemia onde tudo avança muito mais rápido, com disrupções digitais e discussões aceleradas sobre Inteligência Artificial, temos que ser mais rápidos também, inclusive com a arte de desaprender sobre nós mesmos.

Essa foi uma mensagem que me tocou na ATD 2023, evento que acontece neste momento em San Diego, na Califórnia – o maior congresso mundial em treinamento e desenvolvimento humano. A apresentação do Adam Grant, keynote speaker, autor de três best sellers, reconhecido como um dos estudiosos mais influentes na área de Recursos Humanos, psicólogo organizacional, mostrou que o valor de repensar é uma mentalidade. Compartilho com vocês alguns insights dessa apresentação repleta de conteúdo atual e relevante. Acompanhe aqui. A tradução é livre (por minha conta e risco).

Repense e encoraje conversas difíceis

Adam iniciou sua fala nos convidando a repensarmos nossa rede, nosso círculo, as pessoas com as quais a gente se envolve. Todos aqueles que nos cercam nos influenciam – há pessoas que nos orientam, nos apoiam ou até mesmo nos mentoram. Mas ele foi enfático sobre a importância das pessoas que nos desafiam, que têm coragem de nos dizer coisas desagradáveis.

Há pessoas mais propensas a serem “doadoras” ou “tomadoras”, ensina ele. Doadores são aqueles que perguntam “o que posso fazer por você”, enquanto “tomadores” indagam: “o que você pode fazer por mim? ”. Tendemos a presumir que pessoas agradáveis são doadoras, e pessoas críticas são tomadoras. Te convido a repensar essa questão.

De acordo com o especialista, a “agradabilidade” e “desagradabilidade”, digamos assim, não tem relação direta com os valores e motivações das pessoas. Vamos falar dos doadores agradáveis – alguma vez já trabalhamos com eles, certo? Eles dizem o que queremos ouvir. Não criam conflitos, dizem sim a tudo. E sempre vão concordar com você. De outro lado, temos as pessoas “difíceis”, mas que tantas vezes costumam ser as que verdadeiramente se importam. Elas não estão preocupadas em ser agradáveis e fazem perguntas difíceis. “Elas fornecem um feedback crítico que você pode não querer, mas precisa desesperadamente ouvir”, destaca.

“Honestidade é a maior expressão de lealdade, porque quanto mais sincero você for comigo, mais saberei que você está tentando me proteger da pior versão de mim mesmo, que está tentando me ajudar a ver meus pontos cegos. E isso é vital para o aprendizado e desenvolvimento”.

Segurança psicológica nas interações

Todo profissional deveria poder correr o risco de falar, opinar, trazer uma ideia ou uma crítica, sem medo de ser punido, sem a sensação de estar correndo risco, por exemplo, de perder o emprego. Constato a importância desse tema na quantidade de palestras e sessões no congresso. Adam contribuiu com o seguinte recorte: quando as pessoas estão dispostas a te dizer o que você precisa repensar.

Ele citou os hospitais como exemplo: quando as pessoas carecem de segurança psicológica, escondem seus erros. E é provável que os demais repitam o comportamento. Mas quando têm segurança psicológica, os profissionais podem admitir seus erros, estudar as causas, repensar e criar processos para preveni-los. Outro exemplo são empresas de tecnologia: onde há segurança psicológica, há inovação. As ideias se libertam.

Há também o tradicional discurso de muitos líderes, que dizem: “Não me traga problema, traga as soluções” – esta é uma filosofia perigosa: as pessoas só podem falar se tiverem uma solução? E quando não as têm?

Criticando a si mesmo em voz alta

Adam citou um exemplo pessoal como professor universitário em uma conversa com seus alunos: “Acho que o que estou tentando dizer é: olha, eu levo o meu trabalho a sério. Mas eu não me levo tão a sério. O que quer que você veja (de problema), eu quero ouvir”.

Ele acredita que líderes fortes não apenas ouvem o mensageiro, eles se tornam os mensageiros. Não apenas pedem críticas, mas criticam a si mesmos em voz alta. Trouxe também o exemplo de um militar respeitado, que disse ao grupo:

“Escute, se você me vir tomando uma decisão ruim, se você acha que estou prestes a cometer um erro, é sua responsabilidade me avisar. Já me disseram que tenho o péssimo hábito de quando me apego a alguém sob meu comando, não quero deixá-lo ir – mesmo que isso possa comprometer nossa missão. Não podemos ter isso por aqui. Acredito na responsabilidade, meu trabalho é resolver problemas e não posso fazer isso se você não me disser quais são os meus problemas. Eu preciso de você para me proteger de mim mesmo”.

Diante dessa provocação-ensinamento, Adam Grant encorajou toda a plateia a recordar as pessoas com quem trabalham. “Elas já sabem no que você é ruim. Você não pode esconder isso delas. Portanto, você pode receber o crédito por ter autoconsciência e humildade para dizer isso em voz alta antes delas”.

Pense como um cientista

Preciso dizer que adorei mais ainda este exemplo – é um modelo mental. O cientista parte do princípio de que há mais coisas que ele não sabe do que o que sabe – e que aquilo que ele pensa que sabe pode mudar a qualquer momento.

“É ter a humildade de saber que você não sabe, ter curiosidade para buscar constantemente novos conhecimentos. É também sobre não permitir que suas ideias se tornem parte de sua identidade. Você percebe que todas as suas decisões são experimentos. Então, no trabalho, deveríamos tomar decisões entendendo que aquilo é um “teste A/B” e somente. Deveríamos todos nós estar questionando e talvez até abandonando algumas de nossas práticas consagradas com o tempo. Quais são os hábitos que construímos antes da pandemia e que não servem mais? Quais são as melhores práticas que devemos repensar e qual é o novo experimento que devemos executar? Quanto mais rápido você reconhecer que errou, mais rápido você pode avançar”.

Que estejamos, então, dispostos a adotar uma mentalidade mais aberta, a repensar o que sabemos, a desaprender o que soubemos – até sobre nós mesmos. E que em nosso trabalho, com nossas equipes, possamos criar uma cultura de aprendizado e experimentação, encorajar conversas difíceis e motivar a aprendizagem contínua.

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